terça-feira, 9 de outubro de 2018


Meu pai Pedro J. Bondaczuk faleceu essa noite, aos 75 anos de muita luta e integridade.

O velório acontecerá amanhã (10/010/2018) as 11:00 hs no Cemitério da Saudade em Campinas.

Peço aos amigos e pessoas que o admiravam e que acompanhavam seu trabalho que orem por ele.

Gratidão!

Tatiana Helena Bondaczuk Pezoa

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Editorial - Oportunidades de bravura


Oportunidades de bravura



Os heróis são frutos da ocasião. Não me refiro àquele heroísmo do cotidiano, de quem encara as circunstâncias com determinação e otimismo quando tudo é desfavorável, e que sequer é reconhecido por quem quer que seja. O que quero ressaltar são aqueles atos de bravura, súbitos, impulsivos e surpreendentes, em que a pessoa arrisca a própria vida, para salvar a de alguém em risco iminente de morrer, sem medir as consequências.

Por exemplo, é o caso do cidadão comum e pacato, que vê uma criança atravessar uma rua movimentada prestes a ser atropelada por um veículo e que, sem pensar duas vezes, se atira à sua frente e a salva, podendo ou não ser atingido pelo carro (ou caminhão, ônibus etc., não importa). Ou o de quem entra num edifício em chamas para socorrer alguém que tenha sido cercado pelo fogo (um bebê, um ancião, um deficiente físico) e o resgata incólume. Ou tantas e tantas outras ações desse tipo.

Esse heroísmo confere imediata notoriedade pública a quem o pratica. Quem tem essa oportunidade (e a aproveita, claro), ganha manchetes de jornais, reportagens na TV, homenagens das autoridades e o carinho da população. Nada mais justo. Todavia são raras as circunstâncias que nos permitem que nos transformemos, em questão de segundos, de pessoas obscuras e desconhecidas em heróis. Muitos deles, inclusive, passados alguns dias, voltam ao ostracismo e raramente são lembrados. Outros, chegam, até, a ganhar estátuas em praças públicas e seus nomes são perpetuados, “batizando” ruas, escolas, ginásios esportivos etc.

É verdade que todos podemos ser, um dia, heróis desse tipo (não digo que seremos). Tudo depende, reitero, da oportunidade, do acaso, do momento e não apenas disso, claro, mas de se saber agir, com determinação e coragem, sem atentar para as consequências, quando formos compelidos por um sentimento interno a atuar dessa maneira. Não há quem não sonhe, no íntimo, em conquistar, para sempre, o respeito, a estima e a admiração gerais. E, convenhamos, não há mal nenhum nisso.

Já que não somos heróis (ainda), contudo, não precisamos ser covardes. As oportunidades para a covardia, ao contrário das do heroísmo, são muitas a cada dia, e quase infinitas ao longo da vida. Mas só depende de nós não descambarmos para essa condição jamais. Como? Fazendo a nossa parte no mundo. Descobrindo e assumindo o papel que nos cabe exercer na sociedade. Agindo!

A maior covardia, na minha visão, é a omissão. É deixar de fazer o que poderíamos (e deveríamos), por medo, indiferença, egoísmo ou qualquer outro motivo correlato. O romancista francês René Bazin (popular em seu país, onde chegou a ser senador e membro da Academia Francesa, mas relativamente desconhecido no Brasil) escreveu a respeito: “Só duas ou três vezes nos aparece, na vida, uma oportunidade para mostrar que somos bravos. Mas temos, diariamente, várias ocasiões para não ser covardes”.

E quem foi esse romancista? Foi um escritor católico de grande destaque e popularidade na França, em fins do século XIX e boa parte do XX (nasceu em 1853 e morreu em 1932), por exaltar, em seus livros, valores familiares, morais, cívicos e patrióticos. Hoje, muita gente “torce o nariz” para os seus escritos. Não deveria.

Considero o pessimismo doentio e exacerbado como outra forma bastante comum de covardia. Via de regra, o pessimista “de carteirinha” é, também, um omisso. Essa sua alegada visão negativa da vida não passa, na verdade, de pretexto, amiúde utilizado, para a omissão. Raciocina: “´Já que nada vai dar certo mesmo, por que vou me esforçar? Por que vou ajudar os outros? Eles que se virem! Ou que cobrem o governo, que existe para isso”, é o raciocínio de quem só vê obstáculos à sua frente e não enxerga as oportunidades. Quem já não ouviu algum dia esse tipo de declaração?

O pessimista encara a vida como um sacrifício, como um profundo e sombrio vale de lágrimas, repleto de pedras e de espinhos e de armadilhas de toda a sorte. Tolice. Falta-lhe, não somente sensibilidade, mas, sobretudo, compreensão. Falta-lhe sabedoria para entender o que é, onde está e com qual finalidade veio ao mundo.

O sábio, contudo, entende, valoriza e agradece o sumo privilégio que tem: o de viver. Releva os sofrimentos e dificuldades e considera-os nada mais do que lições, do que exercícios que o fortalecem e vivificam. Descobre, a cada momento, novos prismas, novos encantos, novas nuances de grandeza e beleza ao seu redor. Valoriza a alegria, a reflexão, as amizades, o amor e a harmonia. Enfim, sabe viver.

O sábio, portanto, na minha visão pessoal, é sempre um herói, mesmo que não salve jamais alguma vida, não pratique qualquer ato espetacular e arriscado e, por isso, não chame a atenção da opinião pública. Faz o que tem que fazer com responsabilidade e constância, sem queixas e nem cobranças. É útil, otimista, nobre e altruísta.

O sábio descobre o seu papel e o assume plenamente. Para quem tem sabedoria e sensibilidade, a vida não é nenhum “castigo”, mas uma grande festa. Quem tem essa lucidez, participa, com alegria, dessa celebração. Mas, como ressalta o filósofo norte-americano Ralph Waldo Emerson (e eu também enfatizo), “só o sábio” tem essa percepção. Por isso, nunca permite que o pessimismo envenene seus pensamentos, o que o torna um verdadeiro herói.


Boa leitura!

O Editor.


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Teu sal - Núbia Araújo Nonato do Amaral


Teu sal


* Por Núbia Araújo Nonato do Amaral


Colho tuas
lágrimas em
meus lábios
para sentir teu sal.

Seguro tuas
mãos trêmulas
para que me
percebas,

E que,
no escuro,
possas caminhar
ao meu lado...
Inteira.

* Poetisa, contista, cronista e colunista do Literário.

A conta dos oito - Talis Andrade


A conta dos oito


* Por Talis Andrade


A libido obcecada
pelo buraco
transforma
um corpo igual
a outros corpos
com oito buracos
oito desejos
saciados

* Jornalista, poeta, professor de Jornalismo e Relações Públicas e bacharel em História. Trabalhou em vários dos grandes jornais do Nordeste, como a sucursal pernambucana do “Diário da Noite”, “Jornal do Comércio” (Recife), “Jornal da Semana” (Recife) e “A República” (Natal). Tem 11 livros publicados, entre os quais o recém-lançado “Cavalos da Miragem” (Editora Livro Rápido).

Bolinhas de gude e peões - Felipe Diemer de Lemos


Bolinhas de gude e peões


* Por Felipe Diemer de Lemos


Roda o peão em plena rua de terra sem que ninguém se preocupe com isso. Somente o menino que aguarda ansioso o fim do rodear do pequeno artefato de madeira envernizada. Só ele dá risada sozinho ao ver que aquele brinquedinho não faz barulho, mas diverte. Tem bolas de gude em um dos bolsos do velho casaco escolar e enquanto limpa o nariz que escorre ouve os barulhos da sua cidade.

Ouve o som da máquina que perfura as calçadas da cidade e olha de longe abismado com tanto ruído quase ensurdecedor. Ronca a barriga oca desde o desjejum e corre para dentro de casa em busca de um pão qualquer com algo em cima. Volta saboreando o lanche feito pela mãe. É quase meio-dia. Vinte e cinco anos mais velho, o operário da máquina perfuradora também sente fome, mas não pode parar. Não dá para parar. E mesmo que parar, vai faltar dinheiro para comprar almoço porque precisa guardar para o remédio da mulher que está grávida em casa. Limpa o suor e segue a sina diária sem pestanejar, sem murmurar, apenas olhando esporadicamente com testa franzida e olhos semi-abertos o sol escaldante.

Brinca o menino com seus sonhos pueris, ilusões de quem nunca pensa em crescer e a certeza de que tudo o favorece ao redor. Joga bolinha de gude com dois amigos e brigam naquela arena de jogos empolgantes sem olhar para o relógio, sem pressa para terminar, sem prazos para cumprir e sem chefes para fazer exigências. O único medo é de chegar a temida hora de fazer a tarefa ou de tomar banho. Na outra rua, a motoqueira corre ofegante com o capacete em uma das mãos e a entrega na outra olhando fixamente para a numeração dos prédios. Precisa deixar uma encomenda urgente, mas o nervosismo a acaba cegando. Finalmente encontra o prédio, toca o interfone, ouve uma voz adormecida e irritada. Mesmo assim, precisa entrar e fazer seu trabalho. Escuta meia dúzia de desaforos de uma queixosa cansada, pega sua moto e ziguezagueia pelo trânsito enlouquecido das 4 da tarde na cidade grande. Na rua de terra, calmamente a bolinha pára dentro do gude e alguém grita que já era aquela esfera. Um menino toma e o outro reclama. Começam a discutir, mas finalmente um terceiro põe fim à balbúrdia e recomeçam a partida. Estão com os joelhos sujos, os narizes escorrendo e os cabelos sebosos de tanto coçar com mãos cheias de areia.

Nada comparado ao advogado que passa em frente ao campo dos garotos todo alinhado, mala escura, cabelo bem penteado, sapatos impecavelmente lustrados, olhar altivo e passos rápidos e largos. Passa velozmente e sem querer levanta areia e suja ainda mais os compenetrados jogadores de bola de gude. Eles olham com raiva, mas estão mais preocupados com o bater das minúsculas bolinhas e com as regras a serem observadas na partida. O advogado nem sabe onde passou; está concentrado em resolver mentalmente um argumento para apresentar nos minutos seguintes perante uma sessão de tribunal. Sobe as escadas do prédio grande com vidro espelhado da rua transversal a dos meninos e desaparece. Para os garotos, foi apenas mais um adulto chato que só atrapalha as brincadeiras.

Termina o jogo de bolinha de gude ao chamado da mãe de um dos atuantes jogadores. São seis da tarde e precisam se recolher. Os outros dois se olham e ensaiam uma relutância. Pressionam o terceiro a permanecer e desobedecer à ordem da mãe. O protesto só dura até a mãe, quase rouca, aproximar-se e mostrar uma vara e sérias restrições caso não seja atendida. Dissipa-se o local de intensos jogos da tarde. Seis e meia. Para o vigilante do prédio em frente aos meninos só começou mais uma noite de trabalho. Chega de bicicleta com sua marmita, toma o posto, liga a televisão, coloca o casaco na cadeira e senta para vigiar o condomínio. Às 11 da noite, o vigilante precisa se levantar do seu posto e chamar a polícia porque tem bandido no residencial tentando arrombar um apartamento. Os três meninos, nessa hora, dormem bem acomodados embaixo de seus cobertores limpinhos cheirando a amaciante. Só sonham sonhos pueris, quem sabe imaginam as brincadeiras do amanhã breve. Logo vão crescer e ver uma vida diferente das bolinhas de gude e dos peões. Mas até lá se sentem, mais do que nunca, crianças.


*Jornalista, participou de três antologias de escritores gaúchos, mora em Florianópolis e atualmente trabalha como assessor de imprensa. Prepara livro de crônicas e é colaborador ocasional de jornais e revistas.


Soneto da vinda - Berilo Wanderley


Soneto da vinda


* Por Berilo Wanderley



Vim dar-me a ti. Sinto-te, vez em quando.
Nas sombras dos meus sonhos me acompanhas.
Música dos teus olhos me embalando,
Me fazendo sonhar coisas estranhas.
.
Não venho como estavas esperando.
Venho como sou: pobre, sem façanhas.
Só posso dar-te um coração sangrando
Como o sal das minhas mágoas nas entranhas…
.
Vem, bebe em minha boca os meus soluços!
(Ah! quantas vezes solucei de bruços
sobre a angústia que bóia em meu olhar!)
.
Sei que me vais dizer coisas amigas,
Sei que os teus olhos cantarão cantigas
E os meus, de alegres, vão querer chorar.
* Poeta e crítico literário.

Serpente no ovo: o novo fascismo brasileiro - Emanuel Medeiros Vieira


Serpente no ovo: o novo fascismo

 brasileiro


* Por Emanuel Medeiros Vieira


Com violência, "Fake News", apoio dos grupos evangélicos mais reacionários, de donos da mídia, dos banqueiros, dos rentistas, do chamado "mercado" que sempre VAMPIRIZOU O POVO BRASILEIRO, uma figura menor, fascista, nostálgica da tortura, homofóbica, misógina e reacionária como Bolsonaro, cresce nas pesquisas e, para a total desgraça da democracia, pode até ganhar as eleições.

É uma regressão.

Lembro-me de 1964.

(E, contextualizando, recordo-me da República de Weimar (1919-1933), na Alemanha.

Num conflito geral, todos achavam que "domariam" Hitler. Deu no que deu. E ele foi eleito!

Preso político, fui torturado pessoalmente, com revólver enfiado na minha boca, em dezembro de 1970, pelo ídolo do candidato fascista: o coronel Brilhante Ustra.

Que lavagem cerebral é essa?

COMO UM POVO QUE SUPORTOU 21 ANOS DE UMA INFAME DITADURA, EM NOME DE UMA PSEUDO ORDEM, QUE SÓ FAVORECE À MINORIA, QUER ELEGER FIGURA TÃO NEFASTA?

Não podemos calar a boca.

Até um empresário como Ricardo Semler afirmou: "Reconheço que as elites deste país sempre foram atrasadas desde antes da ditadura e nada fizeram de estrutural para evitar o sistema de castas que se instalou".

Não podemos deixar o pavor instruir nossas escolhas.

Para Vladimir Safatle, o cálculo é claro: (...) "Em um país como o Brasil, essa pauta de ajustes neoliberais só pode ser realmente implementada à bala, sob os auspícios de um governo autoritário, que cavalga na mobilização contínua da brutalização social, do desprezo fascista pelos setores mais vulneráveis (índios, negros, mulheres, LGBT, refugiados) e do anti-intelectualismo ressentido que sempre animou parte da classe média brasileira". (…)

É uma espécie de ESPÍRITO ESCRAVOCRATA, da barbárie contra a civilização, que anima "esse" fascismo.

SERÁ UM TREMENDO RETROCESSO SE A "SERPENTE" ALCANÇAR NOVAMENTE O PODER.

E O PREÇO A SER PAGO SERÁ ENORME - PARA VÁRIAS GERAÇÕES.

RESISTAMOS! SOCIALIZEMOS NOSSA INDIGNAÇÃO! A ALIENAÇÃO SERÁ O PIOR DOS MALES;
"ELE NÃO"!


(Brasília, outubro de 2018)


* Romancista, contista, novelista e poeta catarinense, residente em Brasília, autor de livros como “Olhos azuis – ao sul do efêmero”, “Cerrado desterro”, “Meus mortos caminham comigo nos domingos de verão”, “Metônia” e “O homem que não amava simpósios”, entre outros. Foi indicado ao Prêmio Nobel de Literatura de 2018.